domingo, 13 de outubro de 2013

158 - OS LATIFÚNDIOS E A PEQUENA PROPRIEDADE RURAL


158 -  OS LATIFÚNDIOS E A PEQUENA PROPRIEDADE RURAL





     Em Santa Catarina, ao contrário de outras regiões do Brasil, a Coroa Portuguesa decidiu dar concessões de Sesmarias para fidalgos com situação financeira próspera, desse modo asseguraria o desenvolvimento de futuras propriedade.

Produção de Farinha de Mandioca

        Os fidalgos ao adquirirem suas propriedade eram obrigados a declararem que não eram desprovidos de fortuna, que possuíam recursos financeiros disponíveis para investirem na instalação de seus latifúndios.


Propriedades Rurais de Santa Catarina

          Em determinado período ocorreu uma certa necessidade em descongestionar os domínios paulistas, superlotados, superpovoados, com tantos elementos excedentes, as terras do sul, terras estas que eram oferecidas à famílias que se dispunham acompanhar um Capitão Chefe, o qual encantava-se com a oportunidade de ampliar seus poderes, com o desejo de adquirir honrarias, se dispunha a acompanhar os colonos, chefiá-los e até mesmo financiar o empreendimento.

Produção de Farinha de Mandioca

          Em Santa Catarina nem todos os sesmeiros pertenciam a fidalguia de Dias Velho, Brito Peixoto, Rodrigues Cavalinho, ou Correia Pino, os quais já eram senhores abastados, opulentos senhores de escravos em São Paulo e São Vicente.


Propriedades Rurais de Santa Catarina

          Em Santa Catarina muitos dos que receberam concessões de terras não eram senhores de grande folga econômica, porém possuíam um espírito empreendedor, um forte desejo de enriquecer mais e mais, o que os levou rumo as terras do sul acompanhando os primeiros fundadores para iniciarem o cultivo nas propriedades rurais de Santa Catarina. Tais desbravadores pouco traziam além de sua família, quando a possuía, mesmo assim a estes eram concedidas sesmarias, as quais variavam em tamanho, possuíam estes uma procuração para distribuírem pequenas propriedades aos colonos que os acompanhavam.

Propriedades Rurais de Santa Catarina

          Estes latifúndios exigiam grandes somas em dinheiro para que pudessem ser terras produtoras, tudo dentro de certo limite, produziam as mesmas culturas agrícolas de regiões vizinhas, aos poucos prosperavam, embora muitas plantações eram perdidas  pois não conheciam os solos e os da região e o clima.

Produção de Açúcar

           Sem muitos recursos para manterem seus domínios, o que caracterizava a sociedade colonial no Brasil e em Santa Catarina, possuíam os Capitães Chefe poucos escravos, alguns agregados, sendo que os sesmeiros condenavam-se ano após ano a trabalhar arduamente na terra e até mesmo à ruína. 

Propriedades Rurais de Santa Catarina

           Nenhum domínio em Santa Catarina se equiparavam aos domínios dos cafeicultores de São Paulo ou até mesmo os domínios açucareiros do Norte, não haviam culturas agrícolas em Santa Catarina que se fizesse em larga escala, sendo assim não havia a necessidade de grandes levas de escravos oriundos da África ou até mesmo aprisionar indígenas para tal intento.

Produção de Açúcar

           Os indígenas não defendiam suas regiões de caça e plantio em santa catarina, o que não provocou grandes conflitos, assim de certo modo o convívio neste primeiro momento foi pacífico.

Produção de Açúcar

          Como em Santa Catarina não haviam grandes domínios rurais, não se caçou indígenas para a escravidão, bem como não ocorreu a existência de grande número de escravos por ser desnecessário tal investimento. os latifúndios em Santa Catarina antes de prosperarem já estavam condenados à ruína, Dias Velho sucumbe a falta de quem fizesse a defesa da propriedade e da vida dos que nela se encontravam; Brito Peixoto morre na indigência, os sesmeiros foram desaparecendo pouco a pouco, abandonando as propriedades que ano após ano ficavam arruinadas, empobrecidas, mesmo que seus Capitães Chefe persistissem em mantê-las.

Propriedades Rurais de Santa Catarina

           Santa Catarina não conheceu a mesma sociedade colonial  que se desenvolveu no rio de janeiro, São Paulo e em outras regiões, nem mesmo a sociedade dos senhores de engenho, abastados donos de escravos, de senzalas. O latifúndio catarinense não se converteu em grande propriedade colonial, entrando em decadência, aos poucos surge o trabalho livre em pequenas propriedades. 

                 


157 - A GÊNESE DO PROCESSO ABOLUCIONISTA NA PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA


157 -  A GÊNESE DO PROCESSO ABOLUCIONISTA NA PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA



     No ano de 1857 havia na Província de Santa Catarina cerca de 18.000 escravos. Já no ano de 1881 havia um pouco menos, 11.000 negros cativos. É certo que havia um tráfico de escravos da província para outros pontos do Império como São Paulo, mesmo que no ano de 1831 o Trafico fosse totalmente proibido, havia vigilância nos portos para averiguar se alguém praticava esse ato, porém sempre havia um jeitinho.


Escravo na Província de Santa Catarina 


           Do ano de 1870 para a frente o Movimento Abolicionista ganhou forças na província, senhores, senhoras tomavam coragem e alforriavam seus cativos. No dia 07 de setembro do ano de 1870  foram libertos 16 escravos, 12 por conta da Província, 04 por iniciativa de particulares. Havia uma propaganda eficiente por toda a Província, no mesmo ano da Lei do Ventre Livre, na época das festas pela sua promulgação, a Irmandade do Rosário rezou o Te Deum, causou tanta comoção que algumas pobres viúvas possuidoras de alguns escravos domésticos os libertaram. No ano de 1874 no Rio Vermelho, um proprietário de escravos libertou 09 negros de uma só vez, e em 1875 a viúva do Marechal Guilherme, perto de morrer, libertou 09 escravos de sua propriedade. O Cônego Eloi de Medeiros no ano de 1876 ao comemorar seu aniversário, libertou sua única escrava doméstica.  O Movimento Abolicionista Catarinense tornava-se a cada dia mais forte.

Escravo na Província de Santa Catarina

           O Fundo de Emancipação no ano de 1880 libertou 45 escravos, já no ano de 1881 o Fundo de Emancipação enviou para diversos municípios da Província de Santa Catarina mais de 42 contos de réis, deste modo em cada município foram libertos alguns escravos, porém eram poucos escravos sendo libertos, era pouco ainda. No ano de 1884, Francisco de Assis Costa, João Moreira da Silva e Henrique Tavares assinaram e enviaram um convite endereçado aos abolicionistas catarinenses para que participassem de uma reunião no Clube Doze de Agosto. A adesão da Sociedade Dramática Particular Amadores da Arte foi fundamental, isto porque a referida sociedade passou a fazer espetáculos com os lucros voltados à causa abolicionista. Outra Associação Abolicionista, a qual o Tesoureiro Germano Wendhausen transfere todos os seus fundos para a o Novo Clube. Para esta mesma causa surge o Jornal Abolicionista, o qual era dirigido por Francisco Margarida, redatado por José Rodrigues Prates, Pedro de Freitas Cardoso, Luiz Pacífico das Neves, Juvêncio de Araújo Figueiredo e por Carlos Faria. O 1º Exemplar foi editado no dia 25 de novembro do ano de 1884. No clube, em solene sessão é entregue Carta de Alforria para 23 seres da raça humana os quais desde que nasceram vinham sofrendo a dia de suas vidas, agora principiava uma nova aura em suas vidas.

Escravo na Província de Santa Catarina

          De acordo com a Lei de 28 de setembro, na Alfândega na Desterro Capital era feita a matrícula de negros que desejavam ser alforriados, chegou a inscrição 3.032 negros escravos, cada um possuía um título com valor diferente, destes 3.032 foram libertos 1.139 apenas. Os escravocratas tinham muito medo de perder seus negros, perante o movimento abolicionista que tomava grandes proporções, deram um jeito de retirar de Desterro 786 negros escravos. Haviam morrido 459 escravos. Ainda restavam inscritos na Alfândega da Capital desterro um total de 763 escravos, na Trindade haviam 710 escravos inscritos, sendo estes de Santo Antônio e arredores.

Escravo na Província de Santa Catarina

            O Clube Abolicionista ia de casa em casa fazendo sua campanha em prol da abolição dos negros, os senhores e senhoras idosos passava a buscar a Alfândega ou dirigiam-se até a trindade para inscreverem seus escravos a para que viessem a ser libertos, ocorriam casos em que os senhores de escravos libertavam-nos de imediato ao tomarem conhecimento da causa abolicionista, ao ficar sabendo que não importava a cor da pele, que todos pertenciam a Raça Humana.

Escravo na Província de Santa Catarina

            As Sociedades Carnavalescas Diabo a Quatro e Sociedade Carnavalesca Bons Arcanjos prestaram excelente trabalho para a causa abolicionista, a Sociedade Carnavalesca Diabo a Quatro trabalhou na propaganda e na arrecadação de fundos para a campanha, a esta uniram-se os Amadores das Artes, a Fraternal Beneficente e a Musical União Artística. Arrecadaram fundos, organizaram festas e bazares, organizaram apresentações artísticas, arrecadando fundos objetivando a compra de alforrias.

Escravo na Província de Santa Catarina

          Um fazendeiro de Lages libertou, embora condicionalmente, a quantia de 10 escravos, um Senhor de escravos outros 04. Uma Senhora de escravos de Itapocu, Município de São Francisco do Sul, de uma só vez veio libertar 05 escravos. Em Santo Antônio dos Anjos da Laguna foram libertos 26 negros escravizados os quais pertenciam a 15 Senhores. Em tijucas outro Senhor herdeiro de escravos comprometido com a causa libertou outros 07 escravos, incluindo os do espólio de sua sogra. Diante disso o Movimento Abolicionista foi crescendo por toda a Província de Santa Catarina. A notícia de que no Ceará, seguido pelo Amazonas, Rio Grande do Sul, proclamavam o fim da escravidão em suas terras. O Jornal a Voz do Povo, o qual era representado por Republicanos, afirmar ser a escravidão reconhecida, e um abuso abdicar dos escravos sem restituição financeira aos seus senhores, o Jornal a Ideia, editado no Município de Itajaí, o qual era editado e dirigido pelo Senhor Tranquilo A. da Silva, no ano de 1887 anunciava que jamais aceitaria em quaisquer de suas colunas publicar matérias referente a venda ou compra de escravos.

Escravo na Província de Santa Catarina

          Ainda no ano de 1887 o Grupo Dramático Doze de Agosto fez a apresentação de um espetáculo no Teatro Santa Isabel, bem como a Sociedade Carnavalesca Diabo a Quatro promoveu um bazar em prol da causa abolicionista. O Presidente da Câmara Eliseu Guilherme da Silva no dia 24 de março de 1888, bem como os outros vereadores, oficiaram ao Presidente da Província Francisco José  da Rocha, o informe de que na Província de Santa Catarina não havia mais um só escravo que fosse, bem como covidou o ilustre Presidente para uma Sessão Especial a qual seria realizada no dia 25 às 12h00min. No mês de maio a notícia da Lei áurea chega à Província de Santa Catarina, o entusiasmo da população foi geral, na Igreja Matriz foi celebrada missa com Te Deum, a pedido da Câmara, no di 25 de maio ocorreram grandes festejos pelas Igrejas e Capelas da Ilha e Província.

Escravo na Província de Santa Catarina

          Na Praça Barão de Laguna, na Capital Desterro, foram armados 02 Coretos e uma tribuna, onde fizeram eloquente discurso Francisco Margarida, José de Araújo Coutinho, José Segui Júnior e o Manoel da Silveira Bittencourt, na oportunidade não deixou de haver músicas, foguetes, vivas, festas com vendas de cartucho de amendoim, balas de coco queimado, broas de coco, pamonha e muito suco e gasosa, as festividades prolongaram-se por dias, houve apresentações de espetáculos e passeatas.

Escravo na Província de Santa Catarina

            Os principais abolicionistas da Capital Desterro foram Eliseu Guilherme da Silva, Germano e André  Wendhausen, Cruz e Sousa, José Henrique de Paiva, Francisco Margarida, José Segui Junior, Francisco de Assis Costa, João Moreira da Silva, Henrique Tavares, José Rodrigues Pontes, Ricardo Barbosa, Pedro Freitas Cardoso, Luiz Pacífico das Neves, Juvêncio de Araújo, Carlos Faria, Carlos Schimidt, Augusto Lopes, Fausto Werner, Eduardo Horn, dentre outros membros da alta sociedade catarinense, membros ilustres do comércio, das letras, da política e da Imprensa. Dentre estes o sapateiro Manoel Bittencourt, o qual sempre doava pequenas quantias provenientes de seu humilde trabalho, sempre auxiliando como podia para a Causa Abolicionista.

Escravo na Província de Santa Catarina

           Em Florianópolis uma rua passou a homenagear-lhe, Rua Artista Bittencourt, artista por fazer solas e meia solas de sapados com tanta arte que seus reparos ficavam perfeitos, o pouco que obtinha de seu trabalho era doado com sacrifício para que os negros fossem libertos, para que a escravidão fosse extinta de solos catarinenses.



156 - O PROFESSOR JOHANN FRIEDRICH THEODOR MÜLLER CONHECIDO POR PROFESSOR FRIZ MÜLLER

156 -  O PROFESSOR JOHANN FRIEDRICH THEODOR 

MÜLLER CONHECIDO POR PROFESSOR FRIZ MÜLLER



       
       Fritz Müller, pesquisador alemão, naturalizado brasileiro, personagem excêntrico e progressista, viveu grande parte de sua vida na Província de Santa Catarina, entre Blumenau e Nossa Senhora do Desterro Capital.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

          Johann Friedrich Theodor Müller, seu nome completo, nasceu na Alemanha, numa pequena aldeia denominada Windischholzhausen pertencente a Turíngia, próximo à cidade de Erfurt aos 31 de março de 1822. Filho mais velho de um pastor evangélico, desde cedo revelou seu interesse pela Natureza, influenciado por Hermann Blumenau, amigo de seu avô, e de quem receberia profunda influência.
         
Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller
        Foi um naturalista, zoólogo de invertebrados, botânico e professor de matemática e ciências naturais. Foi pioneiro no apoio factual à teoria da evolução apresentada por Charles Darwin.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

          Seu pai foi o pastor protestante Johannes Friedrich Müller, e seu avô materno o químico J. Bartholomaeus Trommsdorff.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

          Fritz Müller foi aprendiz de boticário de seus treze anos até o fim do colegial. Atraído pelas ciências naturais e matemática Müller ingressou na Universidade de Berlim, onde, em 1844, obteve o grau de Doutor em Filosofia e História Natural aos 22 anos, defendendo uma tese sobre as sanguessugas da região de Berlim. Nessa ocasião já pensava em imigrar, empolgado pelas aventuras e descrições do Brasil feitas por Hermann Blumenau – fundador da cidade que leva seu nome, em Santa Catarina. Em 1845 torna-se professor ginasial em Erfut, mas devido a suas crenças liberais e temperamento rebelde abandona o posto. No mesmo ano, decide cursar medicina na Universidade de Greifswald de 1845 a 1848, como meio de facilitar sua migração.


Charles Darwin recebeu diversas cartas do Profesor Fritz Müller


           Em 1840 vai para Naumburg trabalhar numa botica. Em 1841 estuda matemática e história natural na Universidade de Berlin, formando-se no final de 1844 em filosofia. Em 1845 volta a Erfurt como professor ginasial, ensinando álgebra e história natural. Em 1845, Fritz Müller inicia o estudo de medicina em Greifswald, não se formando devido ao seu ateísmo, que o levou a não querer jurar a Deus, pedindo para fazer o juramento judaico, que lhe foi negado.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller
           
           Ele foi filiado por carta a comunidade Livre formada e comandada por Gustav Adolf Wislicenus em Halle. Grupo que era contra a tutela espiritual feita pela Igreja Protestante, e a sua vinculação ao Estado Absolutista. Neste grupo houve a filiação dos chamados Iluministas Luteranos, católicos e descontentes com o Estado Absolutista. Era também membro de um clube democrático, que sofreu perseguições governamentais, assim como as Comunidades Livres.


Presidente da Província João José Coutinho

  Provavelmente, para fugir das perseguições governamentais devido a frustrada Revolução de 1848, Fritz Müller se muda para Pomerânia Ocidental, para trabalhar de 1849 a 1852 como professor particular. Em 1852, imigra para o Brasil, juntamente com uma leva de descontentes com a Revolução de 1848.

Charles Darwin

          Em 1852, aos 30 anos, Müller emigra com sua família, esposa e filha de nove meses e um irmão da Alemanha para a recém fundada Colônia de Blumenau, onde vive por 45 anos, até sua morte em 1897. Nos quatro primeiros anos em que viveu na mata virgem de Blumenau ajudou a construir a colônia, trabalhando na enxada e no machado como simples colono, apesar de sua privilegiada formação acadêmica. Durante esse período pesquisou fauna e flora, relacionou-se com os índios xoklengs e excepcionalmente atuou como médico, pois sua vocação era de naturalista. Sentia-se muito feliz com sua nova opção de vida no que chamava de sua segunda pátria, e nunca mais retornou à Alemanha.

Charles Darwin

            Em 1855 Müller instalou-se com a família na casa em estilo enxaimel que construiu com suas próprias mãos e que hoje abriga o museu de ecologia que leva seu nome. Fritz Müller estudou e descreveu vários grupos zoológicos, principalmente invertebrados marinhos. Tinha um talento incomum para o desenho e suas descrições eram sempre permeadas de ilustrações de incrível detalhamento. Em Desterro estabelece correspondência com várias eminências científicas da época, destacando-se sua extensa e contínua correspondência com Charles Darwin que se estende por 17 anos, até a morte do naturalista inglês em 1882. Foi em Desterro que Fritz Müller atingiu reconhecimento na comunidade científica internacional sendo conhecido por Fritz Müller – Desterro, codinome proposto por Ernst Haeckel, pai do termo Ecologia, para distingui-lo de outros notáveis homônimos alemães.

Presidente da Província João José Coutinho

          Em 1861, Fritz Müller recebeu um exemplar do livro A origem das espécies de Charles Darwin. Ao ler a obra sente-se identificado com as idéias de Darwin. Por ser ateu convicto, sua mente não apresentava nenhuma restrição ou resistência às concepções de Darwin, recebendo-as com natural abertura e aceitação. Inicialmente, pensa em publicar algumas observações gerais em favor da teoria, mas, em seguida, considerou que a melhor prova seria testá-la no campo, com observações experimentais com seres vivos, em vez de restringir-se a discussões teóricas.

Charles Darwin

          Em 1856 começou o seu intenso intercâmbio científico com a Europa. Em 1857 foi recomendado por Hermann Blumenau para o cargo de professor de Matemática, depois também de História Natural, no Liceu Provincial do Desterro, atual Florianópolis, onde permaneceu por 11 anos. A transferência de Fritz Müller para o litoral beneficiou enormemente a ciência, uma vez que a maioria das observações e grande parte da obra deste verdadeiro “biólogo” foram realizadas nas praias de Santa Catarina. Estudou vários organismos marinhos, com destaque para os crustáceos, dando uma especial contribuição à carcinologia.

Presidente da Província João José Coutinho

     Além de representar um dos naturalistas mais importantes de sua época, Fritz Müller foi o primeiro a testar em campo as idéias de Darwin. Utilizou como objetos de estudo crustáceos marinhos, o que resultou em estudos comparativos de embriologia, ontogenia, ecologia, fisiologia e morfologia.

Charles Darwin

          Para testar a teoria darwiniana Müller escolheu os crustáceos, por ser um grupo muito diversificado e abundante no litoral de Santa Catarina e também por sua taxonomia já ser bem estabelecida na época. Fritz Müller postulou que se a teoria de Darwin estivesse correta seria possível demonstrar que os diversos táxons (grupos) de crustáceos teriam se separado uns dos outros, a partir de um ancestral comum, e foram adquirindo características novas em fases sucessivas de seu desenvolvimento (ontogênese), que seriam fixadas e/ou eliminadas pela seleção natural.

Presidente da Província João José Coutinho

           Em 1852, Fritz Müller e sua família se estabelecem na Colônia Blumenau. Em 1855, Hermann Blumenau entra em contato com o Presidente da Província João José Coutinho, para recomendar Fritz Müller e o seu irmão Hermann Müller para assumirem como professores do novo colégio que o Presidente de Província desejava fundar. O motivo da recomendação era o temor que Hermann Blumenau tinha da influência nos colonos da irreligiosidade dos irmãos.

Presidente da Província João José Coutinho

           Entre 1857 a 1864, Fritz Müller assumiu a cadeira de matemática no Colégio Liceo, ministrando, também, aulas de Ciências Naturais como a Zoologia, Botânica e Química por um curto período de tempo. Em 1859, o Presidente da Província João José Coutinho destinou a quantia de 500.000 réis para o professor Fritz Müller adquirir na Europa utensílios e equipamentos para instalar um pequeno laboratório de Física e Química, para que as Ciências Naturais fossem ensinadas de forma prática e moderna. Além desse laboratório, o Liceu também passou a ter um jardim botânico, administrado pelo naturalista Fritz Müller. Em 1860, ocorre a mudança de João José Coutinho, por Araújo Brusque. Este fecha o laboratório e vende os instrumentos.O fechamento do laboratório foi parte do combate a Colégio Liceo realizada em sua maioria por comerciantes e políticos locais, que temiam o fato de haver luteranos como Ricardo Becker, Carlos Parucher, Bukart e Fritz Müller ministrando aulas, em um colégio laico subsidiado pelo governo da Província de Santa Catarina.

Charles Darwin

        O Colégio foi oficialmente fechado em 1864, entretanto Fritz Müller, Amphiloquio Nunes e João José das Rosas Ribeiro de Almeida continuaram ministrando aulas em uma sala alugada pelo governo da província até o ano de 1867. Neste ano,os professores foram despedidos oficialmente, entrementes tentaram reaver seus cargos, buscando reverter judicialmente a decisão de substituição do Colégio Lyceo pelo Colégio Santíssimo Salvador de 1865 a 1869, mantido por jesuítas italianos. E, reivindicando o cargo de professor vitalício que tinham direito por terem realizado concurso público e estarem a mais de quatro anos ministrando aulas. No processo fica decidido que o professor Fritz Müller seria alocado no cargo de Naturalista da Província, em detrimento do cargo de professor vitalício.

Presidente da Província João José Coutinho

           Fritz Müller trocou cartas com diversos cientistas de todo o mundo. Foi reconhecido mundialmente pela publicação Für Darwin, para Darwin no ano 1864, cinco anos após Charles Darwin publicar a obra A Origem das Espécies. No livro, Fritz Müller apresenta argumentos que corroboram a Teoia Evolucionista, através de um estudo empírico sobre crustácios na Ilha de Santa Catarina. Foi o primeiro cientista a apresentar modelos matemáticos para elucidar a seleção natural e fornecer provas contundentes da mesma. Foi chamado por Darwin de O Príncipe dos Observadores, sendo citado mais de dezessete

Charles Darwin
vezes nas edições posteriores do Origin. Darwin enviou aproximadamente trinta e nove cartas a Fritz Müller. Fritz Müller possivelmente trinta e quatro. Fritz Müller publicou na Europa mais de duzentos e quarenta e oito artigos científicos, levando a flora e fauna catarinense ao conhecimento dos europeus.


Presidente da Província João José Coutinho

          Müller deixou uma obra naturalística enorme, que contribuiu para fundamentar e enriquecer a teoria da evolução das espécies por seleção natural de Darwin e projetou o Brasil no cenário da culta ciência europeia. Infelizmente, o legado de Müller é pouco conhecido.

Presidente da Província João José Coutinho
           Em seu estudo pioneiro com crustáceos Müller realizou uma série de observações que culminaram com o descobrimento de muitos fatos novos, principalmente no que se refere ao seu desenvolvimento. O fruto desse longo e minucioso estudo resultou num livro de excepcional riqueza de observações originais Für Darwin (Pró-Darwin). O livro foi publicado em Leipzig, Alemanha, em 1864 (por W. Engelmann) e ajudou a propagar e defender a teoria darwiniana, que tinha suscitado forte reação contrária naquele país. A tradução de Für Darwin para o português foi feita em 1907-08 na revista Kosmos do Rio de Janeiro (versão incompleta) e mais recentemente (1990) uma versão completa foi empreendida por Hitoshi Nomura (Fundação Catarinense de Cultura e Departamento Nacional da Produção Mineral, edição esgotada). Esse denso e original ensaio inclui um número extraordinário de observações sobre crustáceos, abrangendo as diferentes adaptações das espécies de ambiente marinho que migraram para água doce e ambiente terrestre, a assimetria bilateral dos membros, o dimorfismo sexual, o polimorfismo intra-específico e a morfologia e desenvolvimento das diferentes formas larvais. Tudo com ilustrações à mão livre.

Charles Darwin

       Ao longo de 12 capítulos, o livro trouxe subsídios preciosos e decisivos a favor da teoria darwiniana. Como conclusão às suas observações Müller escreve: “Durante o período crucial da dúvida, que não foi curto, quando o fiel da balança oscilava diante de mim em perfeita incerteza entre os prós e os contras [à teoria darwiniana], e quando todo e qualquer fato que levasse a uma pronta decisão teria sido bem-vindo, nunca tive o menor problema com qualquer contradição surgida entre as conseqüências trazidas para a classe dos crustáceos pela teoria de Darwin. Pois nunca as encontrei, nem na época, nem depois. Aquelas que havia encontrado dissiparam-se após uma consideração mais profunda, ou converteram-se em sustentáculos da doutrina darwinista”.


Presidente da Província João José Coutinho

           Cabe ressaltar que o uso de caracteres adquiridos compartilhados (conhecidos hoje por sinapomorfias) para mostrar relações filogenéticas (evolutivas) entre espécies vivas de crustáceos foi uma grande inovação introduzida por Müller. Os diagramas de ramos que ele utilizou, hoje conhecidos como cladogramas por agruparem os organismos e seus ancestrais comuns em clados, e tão utilizados em árvores filogenéticas, já haviam sido propostos por Müller um século antes da teoria cladística, proposta por Willi Hennig. Nelson Papavero relata que Müller foi, certamente, o primeiro a criar uma filogenia séria, com base em observações concretas e exaustivas de material vivo, diferentemente de Darwin, e depois, Haeckel, que propuseram árvores filogenéticas teóricas.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

       Müller desenvolve ainda em Für Darwin, a recapitulação ontogenética da filogenia, que foi fortemente corroborada e divulgada por Haeckel. Na época de Müller, já se sabia que as fases larvais e juvenis dos crustáceos abrangem uma grande variedade de formas. Os crustáceos mais basais nas filogenias, como cracas, copépodes e ostracodes emergem do ovo sob forma de náuplio, a forma larval mais simples. Os caranguejos marinhos e camarões de água doce nascem no estágio de zoea, formas larvais que já apresentam inúmeros apêndices. Já os lagostins de água doce e alguns caranguejos terrícolas (crustáceos superiores) suprimem as fases larvais e a metamorfose e emergem do ovo já sob forma juvenil, pequenos adultos em miniatura.


Charles Darwin

           No litoral de Santa Catarina, Fritz Müller descobriu um camarão marinho do gênero Penaeus que nasce, curiosamente, sob forma de náuplio, antes de passar pelo estágio de zoea. Face a essa observação Müller sugeriu, de acordo com a teoria darwiniana, que os caranguejos marinhos e os camarões que emergem sob forma de zoea, deveriam passar pelo estágio mais simples de náuplio durante seu desenvolvimento embrionário, o que de fato se confi rmou. Hoje, pode-se dizer que os crustáceos derivados, que saíram do ambiente marinho para áreas continentais, “embrionizaram” as formas larvais mais simples de seus ancestrais, carregando a história de seus antepassados na sua fase embrionária (recapitulação ontogenética da filogenia).


Presidente da Província João José Coutinho

         Segundo David West, a Lei da biogenética, de autoria de Haeckel em 1866, que defende que a ontogenia (desenvolvimento individual, de embrião a adulto) recapitula a fi logenia (trajetória evolutiva de um grupo), foi na realidade proposta originalmente por Fritz Müller e “copiada” por Haeckel, que só reconheceu sua dívida para com Müller em 1872.


Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

          Darwin teve acesso ao livro de Fritz Müller em 1865 e percebeu imediatamente o inestimável suporte que a obra representava às suas idéias. Nesse mesmo ano, Darwin escreve a Fritz Müller ... “O senhor fez um admirável serviço pela causa em que ambos acreditamos. Muitos de seus argumentos me parecem excelentes, e muitos de seus fatos, maravilhosos.... vejo a publicação de seu ensaio como uma das maiores honras que jamais me foram conferidas”... O próprio Darwin providenciou a tradução do livro de Müller para o inglês numa edição publicada em 1869, sob o título de Facts and arguments for Darwin. Inicia-se então uma intensa correspondência entre os dois que dura até a morte de Darwin. Mas eles nunca se conheceram pessoalmente.

Charles Darwin

           Darwin referia-se ao amigo Fritz Müller como “príncipe dos observadores” e o considerava como um mestre, apesar de 13 anos mais jovem. Darwin recorreu a Müller inúmeras vezes para elucidar pontos importantes e controvertidos de sua teoria. E Müller supriu Darwin de incontáveis evidências nas áreas da zoologia e botânica que fundamentaram e enriqueceram sua teoria. Fritz Müller é citado 16 vezes nas edições posteriores de A origem das espécies de Darwin. Em carta ao amigo, Darwin escreve: “Só Deus sabe se viverei o suficiente para aproveitar a metade dos importantes fatos que me tens comunicado... Não acredito que haja alguém no mundo que admire seu zelo na ciência e seu grande poder de observação mais que eu”, Carta de 23/02/1881.


Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

A correspondência entre Fritz Müller e Darwin foi publicada em português por um dos autores Cezar Zillig sob o título de Dear Mr. Darwin, em 1997, por ocasião do centenário da morte de Fritz Müller. Durante toda sua vida Müller dedicou-se entusiasticamente à sustentação da teoria de Darwin, através de inúmeras observações minuciosas, muitas delas encomendadas pelo próprio Darwin. Em seu obituário publicado na revista Nature no ano de 1897, questiona-se se algum outro naturalista, além do próprio Darwin, deu ao mundo uma massa tão ampla e original de observações na qual a seleção natural fosse tão consistentemente fundamentada.


Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

           Dentre as inúmeras contribuições de Müller destaca-se ainda o reconhecido fenômeno do mimetismo mülleriano, citado em todos os livros de biologia evolutiva. Quantos biólogos brasileiros sabem que esse fenômeno foi proposto pelo Fritz Müller de Blumenau. O mimetismo batesiano, que propõe que borboletas monarcas palatáveis assumem padrões de desenhos e cores de asas muito similares às borboletas não palatáveis, como forma de proteção contra predadores, parece ser mais bem conhecido. Fritz Müller ficou intrigado em descobrir porque várias borboletas não-palatáveis, em Santa Catarina, apresentavam também padrões de desenhos e cores de asas muito semelhantes entre si. Que vantagem esse mimetismo poderia trazer, já que todas as borboletas eram não palatáveis e, portanto, não apreciadas por predadores? Müller demonstrou que existe uma vantagem real e incontestável nesse tipo de mimetismo que é inversamente proporcional ao quadrado do número de seus indivíduos. Isso significa que a espécie mais rara teria um ganho maior e, portanto, estaria sob seleção natural mais forte.


Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

          Apesar de seu possível desconforto e da necessidade de sobreviver numa região tão inóspita, Müller deixou um enorme legado florístico e faunístico, especialmente da região sul do Brasil, contribuindo para o conhecimento da sistemática, morfologia e fisiologia dos seres vivos. Identificou e descreveu, pela primeira vez um número enorme de espécies de invertebrados marinhos, de água doce e terrestres, além de plantas da região subtropical, sempre enriquecendo suas descrições com ilustrações de incrível detalhamento. Entre o legado faunístico destacam-se crustáceos, abelhas brasileiras, principalmente as sem ferrão, insetos tricópteros, mosquitos, cupins, formigas, borboletas e hemicordados, entre outros. Em seu legado florístico dedicou-se em especial às orquídeas e bromélias, estudando ainda as interações inseto-planta, plantas trepadeiras com seus ramos modificados em gavinhas, movimentos de plantas e folhas, entre outros.


Presidente da Província João José Coutinho

           Fritz Müller deixou um gigantesco legado naturalístico, abrangendo tanto a flora como a fauna da Região Sul do Brasil. Identificou e descreveu, pela primeira vez, com notável perfeição, um número enorme de espécies de invertebrados marinhos, de água doce e terrestres, além de plantas da região subtropical, sempre enriquecendo suas descrições com magníficas ilustrações de incrível detalhamento.

Professor Fritz Müller - Johann Friedrich Theodor Müller

           Dentre o legado faunístico, destacam-se crustáceos, abelhas brasileiras, principalmente as sem ferrão, insetos tricópteros, mosquitos, cupins, formigas, borboletas e hemicordados entre outros. Em seu legado florístico, dedicou-se em especial às orquídeas e bromélias, estudando ainda as interações inseto-planta, plantas trepadeiras, com seus ramos modificados em gavinhas, movimentos de plantas e folhas.


Charles Darwin

           Deixou cerca de 250 trabalhos científicos publicados em renomadas revistas científicas do século XIX. A quase totalidade das publicações de Fritz Müller foi reunida e organizada por seu primo-sobrinho, o micologista alemão Alfred Möller, abrangendo ensaios, artigos científicos, memórias e monografias, envolvendo tanto a zoologia quanto a botânica. Trata-se de uma obra monumental, publicada em três grandes volumes (Alfred Möller, Fritz Müller: Werke, Briefe und Leben, 1815-1821), que garantiram que seu legado não fosse perdido. Cópia desta obra está hoje disponível no Arquivo Histórico de Blumenau e na Biblioteca do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo.